segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

"É sempre amor mesmo que mude..."

Despediu-se...
Foi demorado, progressivo.
Durou meses, até anos.
Doeu muito, parcelado.
Mas, despediu-se.
E de uma noite para outra foi embora naturalmente,
sem perceber, sem se fazer notar.
Apenas foi embora, como se nunca estivesse estado ali por tanto tempo.
Não foi brusco, ao contrário,
doeu o dobro por não ter sido de uma só vez.
Por vezes alimentei-me de falsas esperanças,
de um amor passível de um cuidado.
Era a nossa fantasia, para amenizar o desamparo.
Éramos o nosso porto seguro,
até o dia que aprendêssemos a andar sozinhos.
E aprendemos, os dois.
E foi assim naturalmente...
Que o amor, o ardente amor da gente,
foi virando, virando e virando amizade.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Sem título.

E tão difícil de ler você. Você consegue ser a pessoa mais carente e mais estúpida no mesmo intervalo de tempo. Finge que não me vê, desliga o telefone, some por vários dias. Mas é só te ignorar e você me sufoca com tanto carinho. Do que você foge quando se aproxima de mim? O que você acha que eu posso te dar? Eu não posso te dar. Sua histeria faltante é quase irresistível. É muito fácil se encantar por você. É muito fácil se apaixonar por esta intensidade que você transmite. Mas que bagunça é você. Tenho minhas dúvidas se teria encarado esse precipício se soubesse antes. Você é louca. Você é completamente louca. Você me faz depender de você, dessa confusão que virou minha vida e dessa inconstância de sentimentos que você me fez sentir. Como eu quero te matar. Como eu quero amar você. Eu só queria estabilidade. Era pedir muito? Você pode ser tudo, menos morna, menos neutra e menos imperceptível. Não tem como não notar você. Não tem como não parar dois minutos e pensar algo sobre você. Você é maluca. Você é louca, mas, sem você, tudo fica normal demais, fica branco, fica previsível. Sem você, o dia começa e termina no mesmo horário. Sem você, a casa permanece arrumada e eu permaneço constante. Que tortura é ser normal depois de ter enlouquecido com e por você. Que tortura esse dia branco, sem uma briga, sem um objeto quebrado, sem uma gargalhada verdadeira, sem um amor bem feito. Você, louca, saiu da minha vida do nada, do mesmo jeito que entrou, e me causou uma neurose obsessiva grave. Agora eu tenho mania de arrumar coisas, pedindo pelo amor de Deus pra que você volte pra desarrumá-las novamente.

domingo, 21 de novembro de 2010

Pacto venenoso.

Contemplo-lhe perto do mar, mar de gente, testemunhas desse segredo.
Guardado em silêncio, um pacto, um erro, que a gente selou.
O erro mais certo que já cometi.
Desenho-lhe com a ponta dos dedos, faço do seu rosto minha tela.
Coloco cor nos seus traços e mais brilho em seu sorriso quieto.
Sorriso seu, sorriso do mundo.
Guarde-me, guarde esse segundo.
Não precisamos de diários, guarde em sua retina o reflexo dos seus olhos nos meus.
Fotografias não congelam um momento.
Deixe-me bebê-lo.
Doce veneno que mata aos poucos.
É suicídio querer você.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Poesia do dia

De vestido branco de renda tento desvendar o mistério das flores.
Anjos e fadas me cercam e todos os elementais assistem a beleza do sol rasgando o céu escuro.
Brisa serena de aurora
Cheiro de terra e de vento.
Milagre diário, que passa a 100 km/h da sua janela apressada.
Pressa de não viver, pressa de se sobrecarregar.
Apenas contemple.
Só por um dia.
Contemple as soluções para todos os seus problemas.
Diante dos seus olhos.
Cure-se desta miopia...
Impressione-se com o óbvio.
O extraordinário óbvio.
O relógio zera todos os dias...
Perfeição é a sincronia da natureza,
maré baixa, maré cheia.
A lua em quatro fases pontuais
Seja minguante, por que não?
Mas permita-se ser crescente,
E nova.
Cheia? Só se for de paz.
Equilibre-se
É só você sentir,
é só você ouvir o que seu corpo diz
Sua bomba coração, mais um dia pulsa a favor da sua vida.
Agradeça a ela, agradeça a tudo.
Se você vê, se você ouve.
Se você fala, se você respira, se você toca...
Simplesmente agradeça.
Independente do que você creia
Deus, energia, ciência?
Agradeça.
E viva de fato.
Viva o fato,
Apenas carregue esse fardo,
De ter que viver
Simples e intensamente.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Tempo

Tempo certo, tempo errado, quem sou eu pra julgar o tempo?
Não tenho tempo pra me preocupar com o tempo, a verdade é essa.
Que ele venha e me envelheça, que ele venha e me sufoque de saudade, que ele venha e enxugue minhas lágrimas. Que ele seja sol, que ele seja chuva, que ele passe devagar ou passe rápido.
Eu quero é dar tempo ao tempo, para que ele crie suas próprias razões e saídas.
Que ele seja amigo, que ele seja carrasco.
Que ele tire de mim o doce da boca, mas que também tire o amargo.
O relógio tá correndo, os dias estão passando e o tempo sempre será o melhor que poderia ser.
Mesmo que doa, mesmo que escorra entre os meus dedos, mesmo que eu não queira.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Crise de meia psicologia.

Ando sem tempo, ando sem rumo, meu relógio anda no sentido anti-horário. Eu ando ao contrário e não tenho controle algum dos meus sentimentos. O interessante passa a ser chato no mesmo segundo, as tão intensas sensações beiram os seus extremos - dicotômica, sem meio termo. É doce e amargo, bom e ruim, bonito e feio, na mesma velocidade que me faz incapaz de apreender e transformar em sentido. Não tem sentido, não faz sentido.

A única coisa que permanece constante é a já conhecida voz que fala calmamente ao meu ouvido, talvez seja uma psicose se desenvolvendo, uma alucinação auditiva, quem sabe. Eu sei que ela não me oprime, não me persegue, apenas me aceita. Há quem chame de anjo, de espírito, de guia, de Deus. Há quem diga que são meus pensamentos ao tom da minha voz. Eu digo que é tudo isso: Eu, a psicose, a neurose, a intuição e Deus.

Penso nos livros que li, nos filmes que assisti, nas bocas que eu já beijei, nos sorrisos que eu já ofereci, lembro das cartas de amor que eu já escrevi e sei que isto está em algum lugar em mim que eu não consigo encontrar mais. Eu me perco todos os dias nessa infinitude que eu descobri ser e é escuro olhar pra dentro. Eu não enxergo, tropeço em mim mesma e paro de procurar, apenas sento e espero, como uma criança perdida.

Eu sento e espero a luz do sol trazer novamente a minha coerência e o meu autodomínio, esse texto não tem coerência, mas esse texto revela o que eu sou agora, amor e ódio pela mesma coisa e pessoa, lágrimas de aprisionamento de mim mesma, lágrimas por estar solta demais. Eu sou um paradoxo e não sei o que fazer com isso. Talvez não deva fazer nada, apenas sentar e esperar, ou talvez deva jogar esta histeria num divã, pagar por algumas horas pra ver minhas palavras brigando com meus pensamentos. Outra opção seria beber, sentar num bar barato e beber por cada dia da minha vida até dissolver meu sangue em álcool, ou quem sabe implorar na recepção de um hospital por um coma induzido, uns 5 dias de silêncio profundo, afinal, meditar é um exercício muito difícil pra mim. Pensei também, em comprar antidepressivos, calmantes, antipsicóticos e me dopar de remédios por umas duas semanas, mas não sei, prefiro reclamar somente.

Hoje eu sonhei com o mar, Yemanjá me dava caldos incessantes no sonho, como se quisesse me sacudir, me acordar ou brigar comigo por algo. Foram minutos angustiantes, no qual eu respirava desesperada quando chegava na superfície e logo era interrompida pela a fúria das ondas que me derrubavam e me faziam perder novamente o sentido. Muito provavelmente, esse sonho ilustre este texto e reflita o quanto eu não sei lidar com o inesperado, com a falta de sentido e com os caldos que eu recebo. Talvez esse sonho mostre o meu desconforto por estar longe da superfície, do tranquilo e do previsível. Na verdade, eu acho que não precisaria nem sentar, nem me tratar, nem beber, nem me dopar, muito menos ficar em coma pra entender que eu posso conviver com a crise e o paradoxo sem sofrer tanto assim, afinal, só na matemática 2+2 é igual a 4.

sábado, 23 de outubro de 2010

"Eu quero é mais brincar, melhor é ser criança"

Hoje, a criança que mora em mim resolveu se rebelar. Chega de adultecer! A criança que mora em mim, apareceu quando eu me olhei no espelho. Ela olhou pra mim e eu poderia escutar a gargalhada dos seus olhos. Gargalhada gostosa, daquelas típicas de cócegas. O seu olhar despertou em mim todos os sentimentos possíveis, cai no chão, perdi a compostura e não me reprimi por isso. Ela continuava me olhando ternamente, sorria e me oferecia sua mão macia, pequena e limpa. Brincamos de roda, corremos e nos escondemos uma da outra, gargalhamos muito e por fim, acabamos deitadas no chão, suadas, ofegantes e leves de tanto brincar. Não lembrava do quanto era bom quando ela me visitava, afinal há muito tempo isso não acontecia. Ela era capaz de enxergar o céu nas rachaduras das paredes, fazia das latas de margarina navios e via castelos em caixas de sapatos. Ela criava, ria, brincava. Não estava muito preocupada com a maldade do mundo, nem com a instabilidade econômica, não tinha a menor idéia do que eram as drogas, a violência e as guerras. Ela não estava no passado, muito menos no futuro. Ela vivia o aqui e agora, agora e aqui.

Hoje ela veio me visitar, hoje ela veio cantar e ri pra mim com seus dentes de leite. Ela me entregou uma rosa branca e pediu que eu lembrasse dela toda vez que a olhasse, eu lembro, eu lembrei. Não quero voltar a ser ela, mas quero e preciso que ela esteja sempre comigo. Brincando, relaxando, acreditando com toda alegria, roubando de mim a expressão ranzinza, o mal-humor, oferecendo-me amor incondicional, sem interesses ou contratos, apenas amor. Hoje, eu quero ficar com ela, deitada no chão, rindo e fazendo caretas, hoje eu quero imaginar como seria morar na lua, hoje eu não quero pensar no futuro, hoje eu quero cantar Xuxa, Sandy Júnior e músicas de ninar.

Hoje eu tenho oito anos.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Passando para o passado.

Eu demorei para aceitar que minha intuição, mais uma vez, estava certa. Tenho me despedido de você em cada dia, em cada beijo e em cada momento que sinto que o que era doce tem virado amargo. Tenho me despedido de você, cada vez que escolho silenciar a falar. Tou me despedindo, tou recuando e tou sofrendo com isso. Sinto-me triste, mas não quero ir de contra ao que parece o caminho natural da nossa história. Estamos sucumbindo diante aos meus olhos vermelhos, que tentam desmascarar a falsidade do meu sorriso quando diz que está tudo bem. Não, não está tudo bem. Eu não queria sentir o que eu tou sentindo agora. Eu queria me sentir como antes, leve, sua, bem e só. Sinto falta de você quando estamos juntos. Eu juro que não queria isso, mas não consigo evitar, não consigo não me sentir mais distante, mais atriz, menos eu. Não consigo não sentir que eu estou indo embora. E sei que isso vai passar, o que também me aflige, afinal, vai passar. A gente vai passar, nosso sentimento vai passar e a dor que tanto me machuca agora, também vai passar, e você vai ser mais uma página amarelada e virada, que nesse momento eu só queria que fosse a página atual.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Eu e ele

Segurou minha mão quando eu acordei, suplicou que eu não fosse trabalhar aquela manhã. Pediu que eu ficasse com ele só um dia, só um dia. Que provasse o meu amor.
Como era capaz de me pedir provas de amor se tudo que eu fazia era por ele? Se por ele eu vivia e morria? Ele sabia como me desarmar, era só diminuir os olhos, falar baixinho e se encaixar no meu peito. Pediu que eu não fosse, não queria ficar sozinho, queria o meu colo. Olhei aqueles olhos carentes, iguais aos meus, aqueles traços que vieram de mim e vi quão ausente eu era. Justificava dizendo que era por ele, mas ele era o menos beneficiado. Foi então que resolvi atender o seu pedido, desmarquei as consultas e fiquei. Ora no sofá vendo desenho, ora na minha cama conversando sobre astronautas e estrelas cadentes, ora lendo ou preparando sua comida favorita. Até ele adormecer sobre mim. Um filhote saciado de amor materno. Era eu e ele de novo completos.
Eu senti paz aquela manhã, a felicidade que eu senti vendo aquele ser tão pequeno respirar sobre mim me deixou renovada. Eu podia ser o que for, médica, mulher, mas naquele momento, eu era mãe.
Apenas mãe e amava aquela criatura com não amava mais nada no mundo.

Saudade

Hoje me peguei sentindo saudades, nada que me deixasse triste, não, muito pelo contrário, foram alguns minutos que me fizeram viajar longe, pra perto de você. Lembrei de pequenas coisas, aquelas pequenas coisas, tão nossas, que ficaram na minha rotina depois que nosso amor, não quero dizer que acabou, adormeceu. Coisas simples, como o jeito com o qual você segurava a xícara de café quente, ou seu jeito desajeitado de cozinhar, batendo panelas, derrubando tudo. As inúmeras vezes em que você me pediu opinião sobre o que vestir e como você ficava lindo quando usava aquela pólo azul, azul como seus olhos, que pareciam mar de maré baixa, sereno, tranqüilo. Será que tem outro alguém hoje te ajudando a se vestir? Será que tem outro alguém hoje cuidando de você? Saudade com gosto de domingo de tarde, com cheiro de tempo chuvoso, apenas saudade. Seu número que eu sabia de cor, já não está mais nas últimas chamadas. Até as coisas, antes impregnadas com o seu perfume, parecem ter perdido o cheiro, que se espalhou com o vento, enfraquecendo e indo embora com o tempo. Eu não mudei, continuo deixando cabelo na escova, pasta de dente sem tampa e bebendo café com cinco colheres de açúcar. O engraçado é que quando faço essas coisas, que tanto te irritavam, ainda me sinto repreendida, como se fosse receber uma bronca ou algo assim. Depois dou risada sozinha, afinal, agora eu estou sozinha, sem ninguém pra brigar comigo pelo açúcar, nem pelos outros maus hábitos. Sabe, eu até conheci um cara nesse meio tempo, mas ele era perfeito demais pra dar certo comigo, ele era bom em tudo o tempo inteiro, e nossa isso era uma chatice! Não conseguia imaginá-lo fazendo campeonato de cuspe comigo, como você, nem disputando pra ver quem falava mais palavrão. Tenho quase certeza que ele nunca encheria a cara comigo nem me ensinaria a jogar futebol. A diferença é que todo mundo apoiava esse meu novo caso, acho que querem me casar logo, você sabe como meus pais são e ele um rapaz inteligente, de família, bonito, agradável conseguiu conquistá-los, coisa que você não conseguiu em quatro anos. Enfim, não deu certo, sou intempestiva, impulsiva e inconstante demais, você sabe, e romance morno me nauseia tanto que estraguei tudo. Mas, nada disso importa agora, não nesse texto, a verdade é que eu só senti saudades. Uma saudável saudade pra me lembrar que já fui uma das mulheres mais felizes do mundo e que ainda sou por ter vivido e por poder continuar vivendo aquilo nem que seja numa lembrança vaga de um domingo chuvoso.

domingo, 3 de outubro de 2010

Amor, democrático Amor...

Uma pequena homenagem a meu amigo calouro fã, que fez comigo esse pequeno e fofo texto numa brincadeira emiessiênica.
...
Pareciam perfeitos um pro outro, enfim, mas ela era Serra e ele era PT. E esse foi o começo do fim. O grande dia havia chegado e no momento da apuração dos votos, à medida que os valores apontavam para uma vitória, que não era mais de partido, e sim dele, o amor deles dois ia se perdendo, a cada ponto computado, a cada segundo pra o decreto, para o fim da eleição.

Ele, por alguns segundos em que o coração falou mais forte, pensou em rever sua posição tão radical. Afinal de contas, eleições são a cada 4 anos, mas um amor como aquele, raramente, uma vez na vida... Ela, ao contrário, não pensava, afinal , era ela que estava perdendo as eleições e não ele. Tudo bem, as eleições eram de 4 em 4 anos, mas não conseguiria suportar 4 anos dormindo com o PT, isso feria todos os seus princípios, ainda mais um PT vitorioso, isso não, isso não!

Insistentemente, ele tentou convencê-la de que qualquer disputa, a não ser para estarem juntos, era pequena diante daquele sentimento tão grande e belo. Também argumentou que aquele orgulho tolo limitava demais, a causava problemas por impedí-la de viver intensamente novos momentos, com novos e mais felizes modos de pensar. E ainda deu-lhe flores.

Ouvindo aqueles apelos, ela foi deixando o sentimento invadir aos poucos e quebrar seu radicalismo. É! Até que privatizar empresas estatais não era tão legal assim, e também, o bolsa familia já ajudou muita gente, não podia negar. E assim, disfarçando que estava amolecendo, resolveu ficar do lado do petista mais maravilhoso que conhecia, porque o amor, ah o amor! Esse sim tem o direito de ser apolítico.
.
Camilla Veras e Lucas Gondim

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Solidão

É quando você chega em casa e despeja os cadernos no sofá. É no fim da noite, quando não tem ninguém em casa e os aparelhos eletrônicos estão desligados. É quando ninguém mais te telefona e você não tem mais compromissos pra fugir de si mesmo. É quando é só você e o seu vazio, você e o seu silêncio. E você se olha de frente, através da pele, através das máscaras e se pergunta qual o sentido de tudo, dos livros, das viagens, do dinheiro, do emprego, dos relacionamentos, e quase não sente nada, por nada nem por ninguém, nem por você mesmo.

A solidão percorre cada cômodo da sua casa, deita do seu lado na cama e insiste em se juntar no seu jantar quieto. Que medo deste silêncio! Que medo de escutar sua própria voz lhe lembrando das suas falhas. Medo que inquieta ou deprime, que faz andar de um lado para ao outro ou simplesmente dormir, dormir pra não ter de pensar. E quando não adianta? Quando além de sozinho a insônia surge pra lhe pirraçar? Você se entope de remédios ou vai ler, ou quem sabe encontra alguém só e insone como você para conversar na internet. O que interessa aqui, é que você não se suporta, não suporta este vazio, não suporta e não sabe conviver com este silêncio incomum. Até consegue, à luz do dia, em meio a multidões, mas quando chega o fim da noite... Você foge.

De qualquer forma, não tem como não abraçar esta solidão por alguns minutos, não tem como não passar alguns minutos com o olhar perdido lembrando de alguma coisa que você achou ter deixado pra trás. Não tem como você não sentir falta dos seus pais, ou dos seus amigos ou parceiro, ou quem quer que seja. Não tem como você não senti um pouco de falta de você mesmo, de quem você era a 2, 5, 10 anos atrás e da sua vida com menos crises existenciais e pensamentos nostálgicos.

Esta solidão tanto lhe assombra porque questiona os seus hábitos automáticos, porque lhe indaga sobre questões teoricamente estabilizadas, como seu trabalho ou relacionamento amoroso. Você tem medo de ouvir de si mesmo que precisa sair da posição cômoda e mudar tudo. Tem medo de ouvir que não ama mais aquele homem ou mulher, que não quer mais aquele curso, ou que simplesmente não quer mais viver.

E por isso, eu peço por você e por mim: Querida solidão, deixe-nos sozinhos.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Sobre esse amor...

Escrever sobre o nosso amor, parece ser uma tarefa impossível.
Amor que persiste na distância e no tempo.
Amor que existe, já que não pode ser vivido.
Fruto da nossa projeção, da nossa idealização.
Romântico, intenso e fatal...
Fatal para nossa saúde, para a nossa saúde mental.

Por isso a distância,
por isso o espaço,
por isso a saudade.

E o esforço para esquecer, só faz esse amor aumentar...

Que vontade de não fazer o que é certo,
que vontade de ficar perto,
e tomar esse amor em um único gole,
esmiuçando todos os seus detalhes,
todas as suas fraquezas, lacunas e brechas.

Amor que se auto-sustenta afastado dos seus amantes.
Amor que virou entidade própria, humana , viva...
Independente de mim, independente de nós.
Como pode um amor existir sem seus criadores?

Ah, que vontade de destruir esse amor vivendo.
Vivendo, estragando, devorando.
Até decepcionar as nossas expectativas...

Agora me diz, porque a gente tem tanto medo disso?

domingo, 19 de setembro de 2010

Versos de cabeçalho.

Evito te encontrar,
como se quisesse ganhar tempo,
tempo pra me preparar.

Talvez,
eu já saiba o que vai acontecer quando eu te ver,
mais uma vez vou perder um pouco de mim,
o pouco que entreguei a você.

É como se eu soubesse,
que o dia que eu te encarasse novamente,
as coisas acabariam entre nós.

Não me deixe

Não me deixe regredir.
Não me deixe andar pra trás,
mesmo que eu insista em correr em direção aquele velho abismo,
que eu custei tanto a sair...
Por favor, me segure, me amarre, me interne,
mas, não me deixe voltar lá.
Naquele lugar em que eu só faço errar.
Naquele lugar onde ficar bem é sofrer.
Não me deixe voltar.
Não me deixe adoecer.
Não me teste, não desista de mim.
A única coisa que eu te peço,
é que você não me deixe ir.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Eu me escolhi




Eu escolhi não te escolher, eu escolhi me livrar das coisas que me faziam mal. Isso me lembra um texto que li quando mais nova, onde Chaplin com sua genialidade descreve o autoconhecimento gerado a partir da aquisição do amor mais importante, o amor-próprio. Pois então, acho que me encontro agora neste momento, permeado por um egoísmo saudável, que me coloca no centro do meu próprio mundo, onde eu tenho autonomia e poder de escolher o melhor pra mim.

Realmente, não tenho idéia de quem sou, quase comprei alguns rótulos ao longo da minha vida, alguns estereótipos sociais que categorizam as pessoas como produtos, como se fosse simples assim. "O tímido", "A extrovertida", "A desastrada", palavrinhas simples e perigosas que pressupõe, muitas vezes, que numa mesma pessoa não possa existir opostos, ou mesmo tudo. É lógico que em determinados momentos na vida, algumas características sobressaem mais que outras, isso é fato, mas, não significa que eu resuma a este conjunto de atributos referentes a mim. Eu não sou uma palavra, que se fecha em sua semântica e fonética específica, eu posso mudar a todo momento, eu posso ser boa e má na mesma intensidade. Bom, é por isso que não sei quem sou, e provavelmente nunca vou ter essa resposta. Na melhor das hipóteses posso arriscar saber quem sou agora, mas vestir essa roupa como uma armadura? Não, eu me recuso.

Então, voltando ao meu raciocínio prolixo - adoro essa palavra, sooa tão bonita - estou numa posição arriscada, que exige responsabilidade, afinal tenho tomado algumas decisões difíceis, como esta de não te escolher. Mas, confesso, estou pensando mesmo em mim. Pergunto-me todos os dias: O que eu quero fazer agora? Pode ser a coisa mais fútil e simples, mas tento me presentear e apreciar a concretização daquele desejo imediato, sim, estou mesmo me mimando, e porque não?

Nunca gostei tanto, quanto agora, de estar em minha própria companhia, nunca gostei tanto de fazer algo, sem um porque lógico ou um objetivo específico, somente pelo prazer do momento. Os meus últimos momentos de felicidade plena foi fazendo coisas inúteis ou bobas, exemplo, ficar repetindo minha palavra preferida em francês (Adore) me deliciando com a sua musicalidade e beleza, até rir sozinha de mim mesma, ou então, ficar super feliz com um corte novo de cabelo. Coisas assim, "irrelevantes" fazem parte do momento que estou agora, um momento hedônico, de descoberta do que me agrada, do que não me agrada, do que eu quero alcançar e do que eu quero eliminar. Tenho me perdoado muito também, sei que tou me educando muito mal, mimando e perdoando, mas sempre fui severa demais com minhas próprias falhas, sempre exigi muito de mim, para quê? Para quem? Talvez essa seja a questão que eu preciso responder.

Tenho cuidado muito de mim também, sem o clichê do jardim e das borboletas de Shakespeare. Larguei alguns vícios, principalmente os que envolviam relacionamentos, diminui minhas tarefas, tenho dormido mais horas, tenho me alimentado melhor, tou em dias com o médico (nem tanto), tenho lutado contra o desleixo de cuidar da minha aparência fisica, mas o principal, tenho me cuidado espiritualmente, sem ser filiada a nenhuma religião, afinal, detesto normas de fé. A minha fé brota quando eu vejo uma criança nascendo e mamando, ou um pôr-do-sol. A minha fé é extremante eclética, pessoal e miscigenada, sinto-me filha de Yemanjá, acredito na energia da natureza, me considero espírita, sou curiosa das religiões orientais, fui batizada no catolicismo, já me emocionei muito em cultos protestantes, sou uma pisciana nata, energizo frequentemente cristais e para completar estudo psicologia e adoro a área dela que vai de contra tudo isso que eu citei, a área cética, ateísta. Devia estar numa crise identitária por isso, mas não, eu estou tranquila. Estou descobrindo aos poucos que eu não preciso ser coerente, parafraseando Mário Quintana, não faço força para ser entendido, quem faz sentido é soldado.

E quando eu digo que não te escolhi, não se ofenda, eu não te escolhi por sua causa, mas porque dessa vez resolvi escolher a mim. Estou exercendo o "1,2,3 salve eu", pode ir um pouco de contra aos valores de solidariedade, amor ao próximo, caridade, mas foda-se, eu percebi que pra eu cuidar de alguém eu tenho que cuidar de mim primeiro, que para eu revolucionar o mundo, eu tenho que limpar a sujeira do meu próprio, enfim, eu me permiti, para poder ficar mais preparada para, finalmente, escolher você.

E quem é você? Você é toda simbologia de outro, você é o que tem que vir pra somar, não pra acoplar e virar um só. Você é a profissão que eu escolhi fazer, é meus pacientes, é as pessoas que precisam de mim, é minha família, são as minhas paixões, são os meus amigos. Você é qualquer coisa que não seja eu, se bem que isso é bem confuso, porque nossa interação é bidirecional e a gente se modifica, ao ponto do meu "eu" ter muito de você. De qualquer forma, é uma escolha temporária, não sobreviveria muito tempo se não fosse, mas preciso mesmo dessas férias de você e conhecer a mim mesma, mesmo que eu saiba que é uma missão contínua. Por fim, desejo-me sorte e te desejo paciência.
E que assim seja.


quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Sincronicidade


6h30, o despertador avisava que o dia dela começaria. Levantou sonolenta, entrou no chuveiro e deu inicio ao seu ritual matinal sagrado. Corria pela casa de forma a otimizar o seu tempo, ao passo que no mesmo instante em que se vestia, arrumava a bolsa, escovava os dentes e preparava o café. Ela fazia isso religiosamente, todos os dias, a fim de chegar em seu trabalho com uma folga de horário.

6h30, ele estava atrasado, mais do que atrasado, deveria ter acordado à 1h atrás. Deu um pulo da cama meio atordoado, correu pra o banheiro tropeçando nos móveis, tomou um banho de dois minutos, comeu um pedaço de pão com café gelado e saiu quase correndo, ainda abotoando a camisa.

6h45, não bastava estar atrasado, ainda precisou encarar a chuva. Todo molhado, corria pela rua pensando: "Hoje não é meu dia, hoje não é meu dia". Parecia até brincadeira, mas só no meio do caminho percebeu que tinha esquecido um documento, o único que ele não poderia ter esquecido. Voltou correndo mais rápido ainda, xingando todos os palavrões que conhecia, pegou o documento e repetiu aquele percurso ainda mais afoito.

6h50, ela caminhava lentamente pelos quarteirões da sua rua, cumprimentava os vizinhos, contemplava a paisagem e o dia. O céu estava meio nublado, já devia está chovendo do outro lado da cidade. As nuvens avisavam que em poucos minutos começaria a chover ali também, mas estava tranquila, afinal como era sempre prevenida, tinha um guarda-chuva a tiracolo. Andou um pouco, ajudou uma senhora que cruzou o seu caminho que tinha dificuldades em localizar um endereço, parou mais um pouco, dessa vez para admirar a vitrine de uma loja de roupas, e seguiu seu caminho, sem pressa.

7h00, chegou na estação de trem, ainda tinha tempo, o trem só sairia da estação às 7h20, resolveu sentar num assento do vagão, folear um jornal antigo e esperar.

7h19, ele chega afoito e esbaforido na estação, já tinha perdido o primeiro trem, não poderia perder o segundo que já estava saindo, correu e por muito pouco conseguiu entrar no trem, sentou no primeiro lugar que viu disponivel, só pensava que precisava se ajeitar, arrumar a roupa e os cabelos encharcados e tentar salvar o dia, que já tinha começado mal.

7h20, eis o encontro, ou melhor, o reencontro. Ele sentou, e subitamente ela levantou as vistas por cima do jornal, ao mesmo instante que encontraram com as dele. Numa mistura de surpresa, alegria e espanto, os dois, quase que ao mesmo tempo se dirigiram um ao outro: "Você?"

Riram juntos daquela situação embaraçosa, depois de 5 anos eles se reencontravam ali, num vagão de trem, assim ao acaso (ou não). O fato é que um conjunto de circunstâncias, da vida dele e da vida dela, proporcionaram que eles se encontrassem naquele exato momento. Se ele não tivesse se atrasado, se ela não tivesse andado calmamente, se ele não tivesse voltado em casa, se ela não tivesse olhado a vitrine, muito provavelmente eles não se encontrariam ali.

Possivelmente eles não se deram conta, dessas jogadas que a vida faz, dessa tal sincronicidade que faz com que determinadas coisas aconteçam em momentos tão exatos, onde um segundo sequer, para mais ou para menos, tem o poder de modificar toda história. O que aconteceu depois, não importa muito, o importante é que o destino ou o acaso, esquematizou aquele encontro, de antigos namorados que se perderam com o tempo e com a imaturidade, mas que agora 5 anos depois, num vagão de trem, se reencontram e modificam um ao outro, porque era assim que tinha que ser.


Baseado em:


*Filmes:

Ironias do Amor
Tudo pode dar certo


**Clipe da música : Bad Day - Daniel Powter


sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Coisas que gostaria de confessar a você...


Você, eu e um silêncio ensurdecedor, naquela noite que parecia não ter mais fim. Eu de cabeça baixa, sem coragem de encarar seus olhos e sem coerência alguma para elaborar uma frase com sentido, permaneci impassível diante da ansiedade com que você indagava seu relógio de cinco em cinco minutos.

- Preciso ir embora. - Disparou interrompendo a mudez sufocante daquele momento.

Foi a primeira vez que eu olhei o seu rosto aquela noite. Acompanhei você levantando do banco com movimentos comedidos, afastando-se de mim, e como num ímpeto, num impulso daqueles que parece que o corpo pensa antes da razão, segurei seu braço e pedi que você ficasse mais um pouco.

- Senta aí, eu preciso lhe confessar algumas coisas...

Lembro como se fosse hoje, a sua cara de espanto. Afinal, você nunca tinha me ouvido falar com tanta firmeza; eu nunca havia pedido um minuto se quer, a mais do que você estava disposto a me dar, era a primeira vez que te impedia de ir. Respirei fundo e sem pensar nas consequências, comecei a falar, afinal se fosse pra ir embora que fosse sabendo de tudo.


- Antes de tudo quero que você saiba, que ficar com você foi resultado de uma aposta que eu fiz num bar com uns amigos, na qual o preço a ser pago, caso eu perdesse, era o de ficar com quem eles escolhessem. É, acho que seria redundante dizer que eu perdi. Quando eu soube que você era o escolhido, eu ri bastante, achava que seria facílimo te conquistar e achava que você era tão bobo, que não representava ameaça alguma a meus sentimentos. Ah! E tem outra coisa, quando eu fiquei com você pela primeira vez, não gostei do seu beijo, mas não posso negar que sua envolvência, seu cheiro e seu corpo febril, me despertou curiosidade sobre você. Sabe, também quero te contar, que eu menti pra você diversas vezes, descaradamente e friamente, que eu já fingi sorriso, já fingi tristeza, e o pior, eu te trai. Sim, eu te trai. Não me olhe assim, trai e não me arrependo. Fiquei com seu melhor amigo naquela festa que você precisou ir embora mais cedo, lembra? E pior ainda, fiquei mais de uma vez, sai com ele, me diverti com ele, dormi com ele, enquanto desligava o celular pra não correr o risco de receber suas ligações. Na verdade, fiz tudo isso porque tava querendo fugir de você e fugir da prisão que eu estava me metendo, a prisão de me apaixonar por você. Eu não queria me apaixonar, eu fiz de tudo pra que isso não acontecesse, te evitei, me afastei, te trai, até disse a você que precisava de um tempo, você lembra? Pois é, sobre esse tempo, eu também preciso te confessar algumas coisas, depois que eu te dei as costas aquele dia, eu conheci o amargo que é a sensação de ter cometido o maior erro da vida, mas como minha mente pensa depois que meu corpo, minha primeira reação foi chorar compulsivamente. Pois é, eu chorei por você, e não foi uma vez só, eu chorei várias noites, tardes e dias seguidos por você, eu não sabia se tava chorando por sentir sua falta, ou se tava chorando por me ver naquela situação ridicula, mas eu chorei, eu me abati, eu não estudei, eu não dormi, eu não comi, eu só queria você, eu só pensava e falava de você, logo você, o amor que eu tanto reneguei. Porém, meu orgulho não permitiu te contar isso, mas vou te confessar, aquele reencontro por acaso, de acaso não teve absolutamente nada, eu já sabia que você estaria ali e fui propositalmente para me mostrar a você. Quero confessar, que assim que te vi quase pulei em seu pescoço e me declarei, mas como sou idiota me fiz de dificil, acho que funcionou, afinal nós voltamos...Pois então, tenho mais outra coisa a dizer... Desde que voltamos, sem você saber, eu fiz tudo pra ser boa suficiente pra você. Eu li todos aqueles livros chatos, eu vi todos seus filmes preferidos, escutei todas as músicas que você adorava, suportei seus amigos e ensaiei frases inteligentes pra te surpreender, é, não se espante, eu, logo eu, tão arrogante e vaidosa, fiz tudo isso por você. Sabe, eu entendo que você me odeie depois de tudo isso que te falei, e eu vou entender também se você não quiser nem falar mais comigo. Mas, a pior de todas as minhas confissões vem agora. É a pior porque eu não poderia ser mais sacana com você te dizendo isso num momento como esse, no momento em que você, que sempre zelou tanto por mim, me deixa por ter perdido a paciência com minha indiferença. Você vai me odiar, eu sei, afinal eu esperei seu sentimento acabar pra te contar isso, a minha última confissão...


Nesse momento, meus olhos já estavam cheios de lágrimas. Minhas mãos trêmulas pareciam afetar seu semblante, que deram lugar a uma expressão preocupada. Me calei, para conter a emoção que tava sendo transbordar em sua frente, procurei ar, como se quisesse recuperar a coragem de confessar o que faltava e voltei a falar.

-Pois então, minha última confissão é que eu te amei todos aqueles dias e continuo te amando agora. Foi AMOR, amor mesmo, daqueles que a gente conta nos dedos quando envelhece. Essa é a última coisa que eu queria te confessar, a coisa que te deixaria o homem mais feliz do mundo se eu dissesse a 1 mês atrás, mas que agora eu sei que vai te causar sofrimento. Me desculpe! Mas é isso, eu te amo.

O silêncio voltou a reinar, era um silêncio diferente, era quase um estado de choque pra você e uma sensação de desmoronamento pra mim, tinha me aberto por inteira, sem segredos, sem poses, sem farsas, me esparramei no chão. Abaixei meus olhos de novo e me surpreendi quando senti que você se aproximava de mim, fui deixando sentir sua presença, deu pra escutar que você também chorava, nunca tinha te visto chorar. Você passou a mão levemente em meu cabelo, levantou meu rosto, olhou bem fundo dos meus olhos, acariciou meu rosto lentamente, me deu um beijo na boca, um beijo devagar, como se estivesse se despedindo de cada gosto, de cada espaço, daquela boca que era tão sua, e me abraçou.

- Eu também te amo. - Falou calmamente, com a mesma ternura de sempre.

Meu coração disparou, quase achei que aquilo era um perdão, quase me animei. Até que você interrompeu meus pensamentos e continuou a falar olhando em meus olhos.


- Mas... Nosso relacionamento acabou! Eu vou embora agora, vou levantar e vou sair da sua vida. Só peço que você se cuide, que tenha juízo e que não seja mais tão idiota, de achar que vai se proteger evitando demonstrar seus sentimentos.


Dizendo isso, você levantou, me deu um beijo na testa, virou as costas e sumiu no breu daquela noite que não passava, e me deixou ali, sozinha, ferida e com uma quantidade imensa de amor que eu jamais saberia onde guardar.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Louco amor

 Louco amor,
que me beijou a boca,
que me tirou a roupa,
que tirou todas as minhas armaduras
e me deixou nua,
nua com meu amor.

Louco amor,
que me deixou exposta,
frágil e sem controle,
que me deixou à brasa,
sem pele,
sem máscaras,
sem capas.

Louco amor,
que arrancou do meu peito
o coração vadio,
há tanto tempo sem dono,
há tanto tempo vazio.

E  justamente por isso,
por desaprender a amar e a doer,
justamente por isso,
ele doeu mais,
ele doeu muito mais,
quando perdeu você.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Game Over

No fundo ela sabia que tinha perdido o jogo, no fundo ela sabia o motivo de ter ficado tão cabisbaixa esses últimos dias. Acontece que não ensinaram a ela a saber perder, aliás quem gosta de perder algo que quer muito? Tinha apostado tanto nisso, mergulhado de cabeça, afinal, quando coisas raras assim acontecem, quando sentimentos tão intensos surgem assim, de forma dilacerante, não nos resta mais nada a fazer a não ser mergulhar. Porém, pressupõe-se que após o mergulho deve-se aceitar o preço a ser pago por tanta intensidade, seja na felicidade quase surreal, ou na tristeza mais esmagadora. Tristeza esta, que deixa o coração apertado, aparentemente sem sentido e oco, que lhe tira o chão e lhe dá uma rasteira, para lembrar que por mais intenso que seja o sentimento, você tem que saber viver bem sozinha.

E esse era o quadro agora: Ela, sozinha.

Tentou voltar ao passado, fazer um resgate de quem era antes dessa bagunça toda. Queria recuperar sua segurança, que havia ficado em algum dos bares que ela andou frequentando. Queria recuperar sua vaidade e orgulho, que havia deixado com os homens com os quais passou breves e superficiais momentos nesse intervalo de tempo, momentos tão superficiais, tão desinteressantes que a tornavam cada vez mais gélida e triste.

Resolveu então, ir mais longe, dar um dos tiros no escuro mais perigosos de todos. Resolveu voltar à toca do coelho, arriscar morrer para conseguir sobreviver. Foi o mais fundo que pode atrás de uma resposta, resolveu ir a o único lugar que talvez fizesse aquela angústia diminuir, mas que em compensação poderia lhe criar uma outra angústia, bem familiar, vale ressaltar, mas que ela já tinha superado.

Foi ver pra crê. E viu, viu que de nada adiantou colocar à prova aquele amor que era novo, mas que lhe doía como seus antigos amores. De nada adiantou, se em todo seu percurso aquele sorriso a perseguia, se de uma hora pra outra todo mundo parecia cheirar o mesmo perfume e usar as mesmas expressões. De nada adiantou, se não conseguia tirar aquele cara, que não tinha nada de extraordinário, aquele cara que era tão comum, da sua cabeça.

Ego ferido? Coração partido? Ela não sabia. Ela só sabia que aquela ausência estava doendo mais do que ela esperava, ela só sabia que ver suas expectativas cairem por terra estava sendo muito pior do que imaginava.

Onde ele está agora? Será que ele tem pensado nela também? Será que ele ainda gosta dela? Será que ele também sofre? Vai saber...

Ela só queria que aquilo passasse, e logo. Só queria esquecer de vez aquelas lembranças, tão cruéis por serem boas, tão boas por serem únicas. Ela só queria esquecê-lo. Mentira! Não era isso que ela queria...
-
Na verdade verdadeira, no fundo, no fundo, ela só não queria ter de esquecer.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Colapso dos sentidos

Algo incomum aconteceu esta noite.
Todos os sentidos potencializados.
As cores, as formas, os traços, os cheiros e os sons já conhecidos misturavam-se com os cheiros, sons, formas, traços e cores que eu nunca poderia ter visto.
Eles dançavam ao mesmo tempo no meu campo perceptivo, não mais limitado.
Alumiavam, apareciam, dissolviam-se no tempo e no espaço, embebedando-me naquele sonho estranho e púrpura.
Púrpura, anil, vermelho, amarelo, verde transformavam-se em todas as cores e feriam os meus olhos como flashes certeiros que cegam por instantes.
Eu era um corpo.
Minha mente, alma, espiríto, Deus era um corpo.
Sensações não segregáveis, nem dicotômicas.
Eu era a tenuidade entre a vida e a morte,
entre a sanidade e loucura.
Eu estava exatamente na linha,
no momento exato que se deixa de existir para morrer.
Vi, escutei, senti e pulsei até o limite que o meu corpo aguentaria sem definhar.
Os vidros quebraram nas minhas mãos,
tudo que eu tocava virava areia,
animais tinha corpos humanos
e a luz ofuscava meu senso de coerência.
Eu era capaz de sentir os meus orgãos trabalhando sincronicamente.
O sangue pulsando
As sinapses cada vez mais nervosas
O pulmão inflado
A pele arrepiada
Era vivo, era espécie, era bicho.
Mas que sonho louco, tão corporal, tão viceral, veio de dentro.
De dentro para fora.
Está tudo muito confuso, eu só sei que eu respiro e que meu coração bate.
Eu sinto, eu farejo.
Eu não penso, eu só sinto.

domingo, 8 de agosto de 2010

Feliz ano novo.


Mais uma virada de ano, ela estava encostada na varanda de frente pro mar do seu apartamento, vestida de branco, como mandava a tradição. A casa cheia de pessoas não muito significantes, colegas de trabalho, conhecidos, conveniências sociais. É! É o que ela pensava quando observava aquelas pessoas sorrindo superficialmente em seu sofá.

Era festa de Réveillon, se pudesse fazer um balanço desse ano que passou, com certeza teria mais desgraças do que momentos bons. Um relacionamento marcante destruído que gerou uma separação dolorosa, insatisfação no trabalho que tanto a consumia e não dava o retorno merecido. Tinha se afastado da família, afinal, a última vez que havia falado com seus pais foi no seu aniversário, há uns três meses, por telefone.

Enfim, o ano novo estava a alguns minutos daquele momento, e como todo ano novo, esperanças e sentimentos de renovação e mudança surgem quase como uma obrigação. Listas imensas de metas, de promessas, quase nunca cumpridas. Listas de afazeres, de mudanças, que vão sendo deixadas no fundo da agenda no decorrer do ano, são alguns dos exemplos do quanto à simbologia do “Novo ano” influencia nos ideais de recomeço de uma cultura. Porém, naquele momento aquilo tudo tinha outro significado para ela, que já não agüentava mais observar o tempo passar enquanto ficava inerte, a mercê das circunstâncias. Precisava fazer alguma coisa, mover-se, sair daquela maré de tristeza que ela estava submetida.

Indagava-se sobre suas questões, observando aquele horizonte negro com o barulho das ondas misturado com as vozes das pessoas, que já anunciavam a tão esperada contagem regressiva. Cinco... Quatro... Três... Dois... Um... Feliz 2010! Fogos de artifício agora iluminavam aquele horizonte, abraços, champagnes, brindes e uma felicidade típica que reina nas pessoas durante a virada, completavam aquele cenário, menos pra ela, que permanecia afastada, desligada de tudo aquilo, um comportamento atípico que possivelmente todos comentariam no escritório, afinal não se espera isso de uma anfitriã. Porém, desta vez não se tratava só de uma comemoração e sim de uma mudança, ela precisava mudar e queria começar naquele momento.

Deixou a festa continuar no seu apartamento. Pegou o carro, queria voar para o outro lado da cidade, pra casa dos seus pais. Provavelmente eles já estariam se preparando pra dormir, já não agüentavam mais o pique de uma festa de réveillon. Ela não queria perder mais nenhum segundo, bateu na porta e foi recebida com surpresa por aqueles que ela tanto amava, se sentiu em casa, como há tempos não se sentia. Não foi necessário explicações, nem justificativas, era como se eles soubessem o que ela precisava naquele momento. Colo, e só.

Agora em diante seria assim, ela não perderia mais isso. Perdoou-se, pediu perdão, decidiu que reformaria o apartamento, assinaria o divórcio, afinal, tinha o direito de amar novamente. Procuraria outro emprego ou faria aquele curso que ela tanto queria na sua área, se matricularia na Ioga, no francês e no curso de pintura. Adotaria um cachorro, cortaria as coisas inúteis da sua vida, doaria roupas e objetos velhos, modificaria sua alimentação, faria uma atividade física, começaria uma terapia, enfim, pensou em várias coisas que tinha deixado pra trás e se empolgou com seus novos planos. Queria crescer, fazer uma viagem, conhecer novos lugares, pessoas, culturas. E porque não? Ela só tinha 36 anos. Não precisava ser assim não triste.

Pensava tudo isso, deitada no colo da sua mãe que calmamente acariciava seus cabelos, naquele sofá que tanto tinha marcado sua infância, mas que naquele momento lhe dava a segurança e conforto necessários pra voltar a acreditar nela mesma e no seu novo ano.

- Feliz ano novo, mãe.
- Feliz ano novo, filha.

E dormiu sentindo-se tão, mais tão amada, como não se sentia desde muitos réveillons. Sentiu-se completa, sentiu-se feliz, pois agora tinha certeza de que às vezes, é preciso voltar pra casa para se encontrar.

sábado, 7 de agosto de 2010

Minha querida,


Oh minha querida, como és tola!
Será que não percebe que és linda assim como és?
Tão sensível!
Exalas sensibilidade pelos poros, pelos olhos, pelas palavras.
És tão intensa!
Amas profundamente, te machucas igualmente.
Porque luta pela racionalidade que não combina em nada contigo?
Logo tu que és feita de intuição e sentimento.
Tu és linda assim, minha querida.
Pura emoção!
Tão delicada e frágil como uma pétala, desta que enfrenta ventanias e ninguém sabe.
Protege teu coração minha querida.
E não é fugindo, mas sim admitindo quem és.
E ama, ama esta tua capacidade rara de amar.
Sempre e intensamente.

domingo, 1 de agosto de 2010


Chegou em casa ofegante e angustiada, não acreditava no que tinha acabado de fazer, não acreditava nas palavras que tinha saído da sua boca. Preocupada, ansiosa, perambulava pela casa como alguém que procura uma saída de emergência. Queria fugir! Por um momento não ser ela mesma, queria sumir dali, voltar no tempo, consertar o erro.

Ela costumava se arrepender das coisas que dizia no calor da emoção, afinal sabia que não tinha como controlar a repercussão das suas palavras. Mal sabia que esses momentos de impulso eram, os quais ela era mais verdadeira, mais ela mesma.

Mas e porque então fugia tanto das suas verdades?

Trancou-se no apartamento, desligou o celular, apagou a luz, deitou na cama do jeito que estava vestida e chorou, chorou, sentindo a pior dor do mundo, a dor de ser julgada por si mesma. Chorou ate dormir, como se quisesse se desintoxicar de toda aquela ansiedade e raiva que a consumia.

Ela já não podia mais voltar atrás. Só podia recomeçar no dia seguinte, como já havia feito infinitas vezes, só podia chorar até dormir e acordar como se nada tivesse acontecido. No entanto, essa vez não seria como as outras, ela não sairia tão ilesa assim. Mais cedo ou mais tarde, esse encontro, dela com ela mesma, haveria de acontecer. Mais cedo ou mais tarde, ela precisaria se reencontrar e resolver suas questões. Até porque o apartamento fechado, o celular desligado e a luz apagada são suficientes para protegê-la das coisas externas, mas nunca, jamais a protegeria dela mesma, sua verdadeira algoz.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Quanto vale o seu sonho?

A capacidade humana de sonhar, de criar uma realidade imaginária, distante ou não, do seu cotidiano, sem dúvidas, é confortante e necessária pra o bem-estar subjetivo e psicológico do indivíduo. Afinal, os sonhos funcionam não só como válvulas de escape, mas também como molas impulsionadoras que dão sentido e objetivo à vida, sem falar que são responsáveis também por alicerçar as principais mudanças da história da humanidade.

Enfim, falar do quão bom é sonhar, é bem suspeito vindo de uma pisciana, legitima sonhadora, que vive mais nas nuvens do que com os pés na realidade. Isso pode ser justificado devido ao fato de que no sonho você é livre pra desejar ser o que quer, sem limitações financeiras e geográficas, no sonho você cria um mundo de acordo com seu desejo.

Porém, corre-se o risco perigoso de viver só de sonhos, o que é um erro. Do que adianta passar horas sonhando, desejando e não fazer absolutamente nada pra conseguir transformá-lo em realidade? A depender do grau de dificuldade e de distância do sonho, realizá-lo requer disciplina, coragem, esforço, trabalho, compromisso, responsabilidade e outros mil fatores já conhecidos. Não raramente, isso gera desânimo, comodismo e desesperança, levando, portanto, as pessoas a deixarem seus sonhos em segundo, terceiro ou último plano.

A pergunta é: Quanto vale o seu sonho?

Um dia vi uma frase, em um lugar qualquer, que dizia, “Não pense no quanto custa, mas sim no quanto vale”. É importante que se mude a ótica e que não pense somente nos obstáculos que vai ser preciso enfrentar, pensar somente nos custos é algo, de fato, desanimador. Pense, portanto, o quanto alcançar este objetivo pode ser importante, na realização pessoal que essa conquista acarreta e nos ganhos, nos lucros, que você vai ter ao realizá-lo.

Sonhar ganha um propósito quando você sai do plano da fantasia e transforma seu desejo, por mais megalomaníaco que seja em objetivos e metas, com prazos e planos bem definidos do que você precisa fazer dentro da sua realidade para conseguir alcançá-lo, independente do que seja. Trabalhar mais? Juntar dinheiro? Fazer determinados cursos? Estudar mais? Vender algum imóvel, largar algumas coisas? Seja o que for, acredito que este seja o primeiro passo, além de estar disposto a lutar pelo sonho sem esmorecer diante as dificuldades. Afinal, que graça tem vencer de W.O? Que graça tem a vitória se ela não for suada, nem minimamente conquistada e merecida? Coisas muito fáceis, sem muita conquista logo perdem a graça. Logo se transformam em supérfluos. Seria sonho, se não houvesse nenhum empecilho pra realizá-lo?

O meu primeiro grande sonho foi a UFBA. Nossa! Eu lembro o quanto eu penei, o quanto tive que me esforçar e me dedicar, abrindo mão muitas vezes de viver coisas momentâneas e tentadoras que me desvirtuariam completamente do meu objetivo e da recompensa que me esperava por tanta determinação. E até hoje eu lembro, o quão gostoso foi conseguir realizar esse sonho e sentir o sabor de que você pode ter o que quiser no mundo, basta você não apenas sonhar. Essa coisa de “O Segredo”, não funciona muito comigo, essa coisa de mandar energia pra o universo e esperar conseguir me parece irreal. Nunca vi ninguém ganhar nada, fora loteria e coisas relacionadas à sorte, só por pensamento. Da onde eu venho, felizmente, para conquistar as coisas foi preciso batalhar por elas, nada caiu de graça na conta bancária.

Enfim, sem mais delongas, meus caros e fofos leitores, resolvi escrever sobre sonhos porque nesse momento estou lutando por mais um, bem grande, por sinal. Este meu sonho vai me custar alguns mil euros, muita dedicação em aprender outros dois idiomas e trabalhar, vai me custar aprender a me virar sozinha, a cozinhar, vai me custar coragem, desprendimento e maturidade pra encarar outro país sozinha e muita paciência. Em contrapartida, vai me dar em troca além do sabor de conseguir realizar os objetivos, muita experiência de vida, maturidade, conhecimento, novas perspectivas, independência e o principal, vai dar ainda mais sentido a minha trajetória de vida.

Então, queridos e queridas, o que eu quero dizer hoje aqui é que nunca percam a esperança e a capacidade de sonhar, não deixem que as impossibilidades do dia a dia os paralisem e os transformem em meros sobreviventes da rotina. Sonhem, sonhem alto, sonhem muito. Porém, não deixem que esses sonhos virem horas perdidas, transforme os em objetivos, em metas e em listas, que com ação, disciplina e um pouco de sorte esse sonho vira sim, realidade.


Ps. Não gosto de livros de auto-ajuda, não recomendo e apesar do meu texto estar à cara do Augusto Cury, a cara da auto-ajuda clichê, é a minha dica da semana para todos vocês que estão lendo.

Abraços,

domingo, 25 de julho de 2010

Quinze anos outra vez...


Há quatro anos atrás aquele lugar era dela, muito tempo havia passado desde que ela tinha 15 anos até aquela noite, passou tão rápido, mas muita coisa havia mudado. Ela, por exemplo, nem de longe é a mesma menininha de quatro anos atrás.

- Uma roska, por favor? Avisava que começaria a se divertir naquele momento.
Desfilando pela festa, observava cada canto daquele espaço, a decoração, as cores e os adolescentes, que representavam um pouco do que ela era no passado, as suas expectativas, a descoberta tão pré-adolescente do sexo, da bebida e do namoro. Achava graça do tempo, das mudanças e da ironia que era observar os meninos ali presentes, como os outros a observavam quando mais nova.

Agora ela já estava na terceira roska, “Com mais vodka, viu moço?” E à medida que o álcool começava a fazer efeito sobre o seu corpo, ela deixava de ser apenas observadora do seu passado longínquo e se tornava atuante naquele espaço, como forma de reviver algo que já passou. Fez amizades com os colegas da aniversariante de 15/16 anos, pediu um Whisky com gelo e foi dançar.

Dançava e bebia, sem pensar em nada, sem ver ninguém, era só ela e as luzes, que a deixavam cada vez mais bêbada. Sua idade? 15 anos de novo. Conseguia resgatar os velhos sentimentos ao ver aquelas meninas, tão novinhas, mas tão cheias de vontade de serem adultas. E ela só queria dizer, como já ouviu tanto de outras pessoas mais velhas: - Meninas aproveitem essa fase.

Um Martini com gelo agora, e ela já não estava mais em seu estado normal. Resolveu sentar para ver se amenizava a tontura. Descalça, quase que sem maquiagem, cabelos molhados de suor, sentou-se num banco afastado da pista de dança e começou a apurar sua observação. Para cada gole de Martini, ela misturava mais o que via com o que já tinha vivido. Via casais se beijando, meninas dançando como se o mundo fosse acabar, via a felicidade da aniversariante, quinze anos, de menina à mulher. Via luzes, muitas luzes e sentia seus reflexos cada vez mais comprometidos. O riso frouxo, agora, dava lugar à nostalgia que aquela festa simbolizava.

Mais Martini, por favor?! E ela se transportou. Ano? Entre 2005 e 2006.
Sua primeira lembrança foi de uma festa parecida com aquela, conseguia ver seus velhos amigos e ela com 15 anos, flashes de antigas amigas, de antigas fofocas da turma e de como os meninos eram infantis. Em seguida, lembrou de outro aniversário e voltou a uma das cenas mais marcantes de sua vida, um beijo descompromissado, que resultou num dos seus maiores amores, o seu primeiro amor. O local era bem familiar, e a riqueza de detalhes que lembrava fazia com que ela revivesse aquele momento quase que com perfeição. Ela estava no celular, afastada do restante do grupo sentada num muro baixo, chateada com ele, mas bancando a orgulhosa. Lógico! Ela que não iria atrás. Ele se aproximou, com o mesmo ar descompromissado e um copo de vodka pura na mão, como se quisesse mostrar pra os outros o quão homem era. Duas crianças é o que eles eram na verdade. De frente pra ela, ele olhava seus olhos sem dizer uma palavra, ela meio fria e com um pouco de raiva, tentava disfarçar o quanto aquele olhar amolecia seu coração. Era impossível sentir raiva dele, daquela lábia encantadora, daquele carinho que ele tinha com todas as meninas do universo. Não se lembrava ao certo como ocorreu o beijo, quem tomou a iniciativa, essas coisas. Afinal, era pedir demais de alguém que estava sentada num banco, bêbada, numa festa de quinze anos, quatro anos depois. Porém, lembrava do que tinha sentido naquele dia, sentia que já era tarde demais, que já estava completamente apaixonada por ele apesar dele não querer nada além de um beijo esporádico dela. No entanto, o corpo dos dois já sinalizava que aquilo não acabaria ali, tinha muita química, tinha encaixe. O beijo parecia ter sido ensaiado de tão sincronizado, o cheiro, o gosto, o calor da pele... Nossa! Aquela noite havia sido inesquecível.

Voltou para sua realidade, observava os outros jovens na pista de dança e lembrava de suas histórias. Já estava tonta demais pra distinguir o que era passado e presente e um sentimento de saudade de quem era a tomou quase que depressivamente. Resolveu parar de beber, tomar um ar, ajeitar-se e voltar a seu mundo adulto, tão diferente e não menos interessante do que aquele mundo que ficou pra trás, junto com quem ela era há quatro anos. Foi recuperando-se aos poucos, despediu-se de cada elemento que a remetia ao passado, engoliu o nó na garganta que a nostalgia junto com a sensibilidade alcoólica queria transformar em lágrimas, levantou sentindo-se melhor e com passos mais seguros, tão seguros quanto ela era agora, cumprimentou as pessoas como se não tivesse tomado nenhum gole de álcool e atuou, digna de premiação, fazendo o papel da mulher adulta, inteligente e compromissada com o futuro, deixando pra trás temporariamente, aquela mocinha ingênua de quinze anos que insiste em persegui-la onde quer que ela vá.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Dar ou não à luz?

Hoje estava tentando escrever um texto, mas nenhuma linha me saia, nem uma mísera linha. Foi quase como um parto, um parto de uma criança de cinco meses, prematura, onde quase abortei de tanto querer parir. Minha mente pulsando idéias, a minha pele exalando sentidos e sentimentos, meu corpo transbordando sensações das mais distintas, desejo, saudade, felicidade, carência, angústia... Parecia o momento perfeito, o ângulo perfeito do meu pensamento, o segundo ideal pra transformar intensidade e vitalidade em palavras.
E? Nada! Simplesmente nenhuma palavra ou pelo menos nenhuma que me surpreendesse ou descarregasse essa energia. Escreve, apaga, escreve, apaga, escreve e apaga mais uma vez. Meu desejo virando sono, minhas idéias ficando cada vez mais confusas, minhas sensações escorrendo entre os poros e a página em branco, branco como a minha claustrofobia. Claustrofobia que minha mente me causou de tanto sufocar e fechar meu cérebro com uma imensidão de palavras soltas, desconexas, fragmentadas, repetitivas, repetitivas, repetitivas e repetitivas.

É, acho que vou esperar essa gestação completar seu ciclo natural, não vou parir só palavras, vou gerar um filho completo, no tempo certo.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Uma foto, uma carta...

Rio de Janeiro, 15 de novembro de 2001

Querido Rangel,

Provavelmente você estranhe receber uma carta minha após tantos anos, logo minha, que nunca escreveu sequer uma linha pra você. Acontece que hoje, em meio à arrumação para mudança do meu apartamento, encontrei uma foto sua. Você ainda usava aquele bigode que eu detestava e tinha aquela mania que me envergonhava de tirar fotos com o cigarro no canto da boca. Eu estava arrumando caixas, jogando papéis velhos fora, enrolando objetos em folhas de jornais antigos e eis que dei de cara com essa foto. Permaneci em silêncio sentada no chão empoeirado do meu apartamento com vista para o mar. Lembra o quanto você gostava da vista do meu apartamento? Fizemos os melhores planos do nosso efêmero caso diante dessa vista de exatos 60 cm, o tamanho da minha janela.

Logo quando você partiu, todos os dias às 17h45 eu me debruçava sobre a janela e observava aquele mar, ora revolto, ora límpido, numa tentativa frustrada de reviver você. Encostada ali lembrava da maneira como decidíamos nossas viagens, inesquecíveis viagens; lembrava de você me dizendo “Pequena, só existe o agora, eu não sei se estarei com você amanhã, então, vamos aproveitar!” Nossa, como essa frase, tão sua, me deixava insegura e me fazia todos os dias olhar para o lado esquerdo na cama, após acordar, com medo de que você não estivesse mais lá. Vivia na iminência de sua partida, afinal, entre a gente não existia futuro. Nossos planos eram breves, aventureiros e felizes. Dez anos se passaram desde que você foi embora, o apartamento e a janela ainda continuam os mesmos, mas eu não. Sinto falta da nossa impulsividade e desprendimento quanto ao resto do mundo, a verdade é que eu invejava o seu desapego, a sua imprevisibilidade, inconseqüência e intensidade, nossa, como eu queria ser como você. Apesar da curta duração, o nosso caso foi o mais intenso de toda a minha vida. Com você eu não me sentia segura, nem protegida, nem confiante, nem amada, nem esposa, nem nada, eu me sentia livre.

Admirando aquela foto permaneci por mais alguns minutos, que pareceram os meses do nosso curto caso, lembrava dos seus cabelos molhados, do cheiro do seu shampoo e dos cachinhos que eu enrolava no dedo quando depois de uma daquelas noites loucas de sexo você repousava a cabeça em minha barriga. Lembro de você brincando com ela, esfregando sua barba mal feita e me fazendo cócegas. Lembro de você cantarolando Bob Dylan, enquanto tomava banho e dirigia. Nossa! Como você dirigia mal. Agora rindo sozinha nesse apartamento imenso, sem você, consigo lembrar de você batendo na minha bunda na frente das pessoas. Eu lembro também do seu amor por cigarros, que eu tanto detestava, meu apartamento ficava impregnado, cheirando a fumaça, e esse era o motivo mais frequente das nossas brigas de dois segundos, que você tinha a malícia de calar quando roubava de mim os melhores beijos que eu já dei na vida. Hoje, senti saudade daquele cheiro sufocante de fumaça no meu quarto, senti saudade de você.

Não tenho idéia de como você está hoje em dia, afinal, dez anos se passaram. Nem sei se enviarei esta carta, ou se você se encontra ainda no mesmo endereço, mas eu sei que estou me mudando. Finalmente, vou seguir seu conselho e sair dessa vidinha de merda de escritório e patrão, vou seguir o meu sonho, vou seguir meu coração e nada mais perfeito do que encontrar a foto de quem tanto me incentivou a fazer isso. Sincronicidade? Talvez.

Apesar da dor que você me causou no dia que foi embora, viajar o mundo lembra? Apesar de ter lhe esperado voltar todos os dias desses anos, só neste ano, no momento em que tomei a decisão de largar tudo aqui, só nesse momento, o significado da sua passagem em minha vida fez verdadeiro sentido. Você me libertou, você me ensinou a ser livre e só depois de dez anos eu consegui entender sua lição. É, mais uns dois dias e termino de arrumar essa bagunça, guardei sua foto agora na minha carteira, pra não mais deixar você se perder nas minhas lembranças. Espero que com você esteja tudo bem, que tenha reduzido esse cigarro e aquietado mais esse espírito. No mais, está tudo em paz.

E ó, eu te amo!

Com amor, Olívia

domingo, 18 de julho de 2010

História por trás da história.

Sábado, 17 de julho de 2010, mais um dia de chuva torrencial em Salvador. Em noites assim Bárbara trabalhava pouco, aliás durante toda essa semana de chuva ela tinha tirado só o suficiente pra tomar um café gelado no bar do Tião, pagar algumas contas e juntar para pagar o aluguel atrasado do seu quartinho no "Casarão", afinal, aquele quartinho era seu local de trabalho.
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Neste sábado, Bárbara não tinha conseguido nem metade do que ela consegue em um final de semana sem chuva, tinha tirado só R$50,00, dois programas, apenas dois programas! Sentada numa calçada permanecia observando a madrugada rasgando a noite junto com a chuva grossa, que lavava as ruas sujas da Cidade Baixa. E pensava...Pensava no quão pouco tinha ganhado, pensava nos três meses de aluguel atrasado, no quanto Deus era injusto e na sua esperança em um dia sair daquela vida e voltar pra casa da sua mãe no interior onde deixou sua filha de três anos.
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Bárbara tinha 22 anos, era uma morena bonita, alta, que chamava atenção entre os frequentadores dos bares da Cidade Baixa, conhecida como Luana, seu nome de guerra, e que apesar da pouca idade, tinha malícia de quem tem muita experiência e história pra contar. Seus cabelos castanhos meio crespo meio ondulado, combinavam com o tom da sua pele e dos seus olhos. Lábios carnudos, peitos pequenos, quadris largos e uma bunda grande e empinada que reforçavam sua fama e a faziam uma das prostitutas mais cobiçadas daquela região. Ela cobrava R$ 25,00 por programa completo, quase sempre realizado no seu pequeno quartinho no ''Casarão", preferia que fosse lá, afinal, era mais seguro.
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Nesta noite de nada adiantou expor seu belo corpo na rua e se perfumar com um perfume barato qualquer, só tinha conseguido dois clientes, dois! Na medida em que o tempo passava, a chuva só aumentava. Já eram 2h00 da manhã, Bárbara ainda estava sentada na calçada próxima ao seu apartamento. Ela não gostava de dias ociosos, não só pela falta do dinheiro, mas porque abria espaço pra ela pensar demais, mais do que deveria. Acabava sempre no mesmo destino, Irará, ao lado de sua filhinha que teve que deixar quando mais nova. Neste dia não foi diferente, no intervalo entre as expectativas que surgiam quando um ou outro carro passava na rua, ela deixava-se lembrar dos olhinhos pretos da sua filha e das suas mãozinhas tão pequenas. - Como ela está agora? Será que ela mudou muito? Será que está menos parecida com o vagabundo do pai e mais parecida comigo? Se perguntava em silêncio. Bárbara pensava todas as noites após seus programas que não queria aquela vida para a filha, pedia a Deus que fosse mais benevolente e não permitisse jamais que ela entrasse nesse caminho, que a matava um pouco todos os dias e a transformava, em cada sexo, numa alma sem brilho, como uma cédula jogada no canto da cama após cada expediente.
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3h da manhã, a chuva cada vez mais forte, agora seu shortinho com top representavam quase que uma tortura, tremia de frio e já conformada e cansada de esperar resolveu voltar pra o seu quarto e dormir. Há quanto tempo não dormia 3h da manhã? Nem lembrava mais... Entrou no seu quarto, deu de cara com sua cama desforrada lembrando-a do seu último programa: - Até que o cara tinha uma boa pegada, lembrava ela. Tirou a roupa, juntou as moedas espalhadas na penteadeira e colocou no seu cofrinho escondido dentro do guarda-roupa. Naquele cofrinho estava seu sonho, mais alguns meses de trabalho e em dezembro ela poderia comprar sua passagem e visitar sua filha, talvez voltasse, talvez não, mas precisava rever mais uma vez aqueles olhinhos pretos e mãos pequenas que tanto a marcaram na despedida.
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3h30 da madrugada, só de calcinha Bárbara estava deitada, sem sono, é bem verdade, em outros dias ela estaria trabalhando, mas deitada de luz apagada olhando pra o teto escuro ela estava, até a hora que cansasse e finalmente pegasse no sono. Escutava o barulho da chuva, estava tão próxima à ela, parecia cair no seu teto, e não no prédio de 5 andares. Era incrível porque a chuva conseguia ficar cada vez mais forte e o barulho do mar revolto misturado com o barulho que a enxurrada fazia na rua, transmitia a Bárbara uma sensação de desproteção. Porém, mais desprotegida do que ela já estava? Impossível.
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3h45 da madrugada, agora além da chuva, ruídos estranhos começaram a soar no prédio. A chuva parecia cair no seu teto de tão forte e junto com isso, vozes fora do apartamento começavam a emergir e tirar sua concentração, eram suas vizinhas que agora reunidas no corredor comentavam preocupadas se aquela estrutura tão rachada e entregue ao descaso resistiria a tamanha fúria da natureza. Como que numa coincidência o primeiro pedaço de teto foi ao chão e logo em seguida, como efeito dominó, toda estrutura do prédio, que ia desmoronando em série como um monte de areia. Ouviam-se gritos e já não era mais possível identificar os autores, os mais próximos à porta correram, os que observavam verdadeira trágedia já se adiantaram a ligar para os setores responsáveis, bombeiros, policia, o que fazer? Há um prédio caindo na Cidade Baixa com pessoas dentro, o que fazer? E a chuva não cessava...
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E assim, com cada bloco de cimento que caia, iam morrendo as angústias, as tristezas, os segredos, as saudades, os sonhos e as esperanças de Bárbara, junto com seu corpo agora soterrado entre os escombros do que um dia foi o famoso "Casarão". Ainda meio viva, meio morta procurava com os olhos - a única coisa que ainda conseguia mexer - o seu cofrinho com o dinheiro que valia sua felicidade. Sem sucesso, em meio à fumaça de poeira, à choros e pedidos de socorro, Bárbara se deixava vencer aos poucos (ou será se perder?) e sentia a morte penetrando seu corpo, de forma diferente dos homens com quem dormia. A dor era mais aguda e de longo alcance, de forma que a sua melhor atitude seria fechar os olhos e esperar. Esperar só mais um pouco para quem esperou tanto, era quase que nada. Porém, agora sim ela sairia dessa vida de programas, mas não mais para os braços pequenos da sua filha, mas sim pra não se sabe aonde, céu, inferno, além? Talvez... Nesse momento a única coisa que ela pensava além da dor que percorria todos os cantos da sua alma e corpo, era nos olhinhos pretos e mãozinhas pequenas que tanto amou e tanto desejou tocar e ver novamente, como não foi capaz de amar e desejar mais nada na sua vida, nem à ela mesma, muito menos à cada homem com quem deitou e permitiu que lhe levassem pedaços.
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*Na madrugada de sábado, um prédio de 5 andares do século XIX desabou na cidade baixa, a 400 metros do Elevador Lacerda, também na capital baiana. Uma mulher morreu e três pessoas ficaram feridas. Três dos cinco andares do prédio, conhecido popularmente como 'casarão', desabaram internamente. A parte externa do imóvel não caiu, mas apresenta rachaduras e está ameaçada. O local era alugado para garotas de programa. - O GLOBO
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*Bárbara é uma personagem fictícia.

domingo, 11 de julho de 2010

Talvez

Hoje por acaso, tocou uma música que você tinha me mandado, na sequência das músicas que eu estava ouvindo no computador. E eu só consegui lembrar de você repetindo ela um milhão de vezes no carro, prometendo que seria a última. Logo, lembrei do seu sorriso tentando me enrolar, um dos sorrisos mais bonitos que já vi, não pela perfeição da boca e dentes, não por isso, mas pela verdade que ele consegue transmitir.

Hoje, foi em você que eu pensei quando quis escrever. Talvez porque ouvir aquela música e lembrar teu sorriso tenha me transportado até você. Foi como pegar o avião e te encontrar em São Paulo. Talvez eu quisesse mesmo que isso acontecesse, talvez não. Talvez eu esteja curtindo essa falta diária que você tem feito. Talvez eu esteja curtindo sorrir sozinha lembrando dos seus trejeitos.

Sinto-me feliz em saber que de agora em diante eu só quero e penso em você. Não sei nominar, mas a sensação é parecida com a de encontrar a palavra perfeita na construção de um texto ou quase como encontrar dinheiro no bolso. Não, não é como isso, é muito melhor.

É muito e é melhor.

Cinco de maio

Eu entrego você a vida, ao tempo, ao vento e ao mundo.
E se eu for seu mundo, seu tempo, seu vento e sua vida,
você há de retornar aqui, de onde você nunca deveria ter saido.

sábado, 10 de julho de 2010

Doce partida



''Vem aqui comigo?!" Lhe perguntei isso estendendo uma das minhas mãos trêmulas, o que revelava o quanto essa frase tinha custado a sair não só da minha boca, mas da minha cabeça armada de censura. Você me deu a mão, e assim fomos andando de mãos dadas em meio a chuva, desviando de pessoas que místicamente ficaram invisíveis naquele momento. Era eu e você de novo. Aonde? Não sei. Quando? Não importa. Era eu e você e um silêncio gritante.

Sentamos na calçada, você me deu seu casaco pra me proteger da chuva, abracei seu casaco como quis abraçar você, queria sugar aquele cheiro de forma que ele entrasse em meu corpo e ficasse em mim depois que você fosse embora. Não precisávamos falar nada, era desnecessário. Sua mão sem soltar a minha, me atualizava de suas novidades. E entre elas eu li no seu olhar que seu amor por mim ainda não tinha acabado.

Tá e agora? O que fazer com essa informação, se as coisas jamais serão como antes? E então, que diferença isso faz? Ai é que está, nenhuma. Talvez se eu soubesse disso há dois meses teria repetido os mesmos erros, mas agora? Depois de tudo que aconteceu? Não... Não mesmo!

A melhor parte é que você me entendia, tão bem, como nos velhos tempos. E você entendia que a única coisa que eu queria era parar aquele momento, mas depois virar as costas e ir, sem ao menos olhar pra trás. E assim aconteceu. Tão bom te rever, tão bom ser você de novo, tão bom quanto voltar na casa do campo que eu tanto brinquei na infância. Porém, uma hora a cidade chama e as buzinas da realidade me dão forças para vestir seu casaco, levantar e seguir, atravessando sozinha agora aquela multidão de pessoas. Indo finalmente embora.

Talvez não para sempre, visto que sempre não existe. Mas sim por um bom tempo, o suficiente para que sua mão e olhar não mais me diga ''Eu te amo''.

Dispa-se

Vem, vem aqui. Rápido, rápido! Tira essa roupa.
Tem que ser agora, nós não temos mais tempo.
Tem que ser agora e aqui. Vamos, rápido. Vem logo, eu tou enlouquecendo.
Tire essa camisa, tira essa roupa, me mostra você.
Me mostra quem é você, por inteiro, rápido!
Tira, tira, tira essa máscara.
Deixa eu lhe ver, deixa eu lhe olhar.
Me mostra, você não consegue?
Vai, fica nú, dispa-se de suas mentiras, das suas poses, das suas atuações.
Eu quero ver além, eu quero ver você.
Não se esconda, olhe pra mim, tire essa roupa.
Só assim poderei ser tua e mergulhar em você.
Eu quero você assim, simplesmente você.
Isso, isso, assim... Livre-se de todas essas peles.
Eu quero ir mais fundo, mais fundo.
Será que você consegue? Eu te desafio.
Me mostra, se arranca pra mim.
Não consegue? Não?
Então sai, sai, vá embora.
Eu não te amo mais.